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sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

*Lei do Karma

A lei do Karma, que significa literalmente lei de causalidade dos atos, diz que todo ato realizado na dualidade de um sujeito e de um objeto, quer seja esse ato físico, verbal ou mesmo material, acarreta um efeito de volta para aquele que age. Esse efeito é de início completamente invisível e imperceptível, semelhante a uma marca ou uma semente que se inscreveria nas camadas mais sutis da consciência individualizada, aquém mesmo do inconsciente dos psicanalistas, na alayvijinana, isto é, o reservatório, ou melhor, o potencial da consciência. A partir desse estado latente começa um processo de maturação que se estende geralmente por várias vidas, até mesmo sobre centenas de vidas, ao fim do qual a semente cármica exprime-se determinando, sejam circunstâncias gerais de uma existência (sexo, nacionalidade, riqueza, possibilidades físicas, intelectuais e afetivas, etc.), sejam condições passageiras (uma doença, um encontro, um sucesso, um fracasso, etc.). O todo funciona – trata-se apenas de uma comparação – à maneira de um computador: os dados ali são extremamente numerosos, agindo uns sobre os outros, e a adição de novos dados modifica, mais ou menos, os resultados. Visto que agimos constantemente sob o império da dualidade – funcionamento deformado que só cessa com a liberação – é um fluxo permanente de novos elementos que nutre nosso potencial cármico, ao mesmo tempo que uma constante maturação elimina dele antigas impregnações. O conjunto do processo, longe de ser extático, é um movimento contínuo. Resta não esquecer que todos os fenômenos que regem nossa vida são a expressão de nosso karma e que isolar um elemento é um erro com freqüência cometido. Pensar que, por exemplo, se cairmos enfermos, é um resultado cármico e que é, portanto, inútil nos tratarmos é uma concepção completamente fragmentária, esquecendo que nosso carma quer que tenhamos também médicos e hospitais a quem nos dirigirmos.
A lei do karma é, de fato, uma visão muito ampla das leis físicas que gerem nosso universo. Se semearmos trigo, não crescerá arroz. O acaso não governa nesta matéria, assim como não interfere nas condições de existência dos indivíduos. Muito complexo, pois dependendo da interação de uma infinidade de elementos, a causalidade cármica resume-se, portanto, a um princípio muito simples: quem cria o sofrimento imprime em seu próprio âmago um potencial de sofrimento, quem cria felicidade imprime um potencial de felicidade.



*Nota de roda pé para explicar potencial cármico, do livro: Meditação – conselhos aos principiantes. Autor: Bokar Rímpoche. Editora ShiSil.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Quando tudo se desfaz


Quando tudo se desintegra, somos submetidos a uma espécie de teste, e também a um certo processo de cura. Achamos que o sentido está em passar no teste e superar o problema, mas a verdade é que as situações não têm uma solução definitiva. Elas se compõem e desmoronam. E mais uma vez se compõe e desmoronam. É simplesmente assim que funciona. O processo de cura ocorre ao deixarmos existir espaço para que tudo isso aconteça: espaço para o pesar, para o alívio, para a angústia e a alegria.

Pensamos que algo vai nos trazer prazer mas, na verdade, não sabemos exatamente o que vai acontecer. Achamos que algo vai nos trazer infelicidade, mas também não sabemos. Acima de tudo, o mais importante é deixar espaço para o não saber. Tentamos fazer aquilo que achamos que vai nos trazer alívio, mas é impossível ter certeza. Nunca sabemos se vamos nos sair muito bem ou se vamos falhar redondamente. Quando sofremos uma grande decepção, nem sempre chegamos ao final da história. Esse pode ser simplesmente, o início de uma grande aventura.


Trecho do livro: Quando tudo se desfaz

Autor: Pema Chödrom

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Quero me tornar uma pessoa bonita


Todos os dias e em todos os momentos, as pessoas caminham sem se dar conta de que revelam no rosto e no corpo tudo aquilo que já viveram. Esse desnudamento pode ser embaraçoso e até mesmo assustador. Que coisa terrível!

Desde nosso nascimento, tudo o que pensamos e falamos, todas as nossas ações e intenções, tudo isso molda nosso corpo, nossa mente, nosso ser. Basta um simples olhar e toda nossa caminhada, etapa por etapa, nitidamente se revela para aqueles que sabem ver.

Depois dos quarenta anos de idade, somos responsáveis por nosso rosto. Teria sido dito por Lincoln?! De fato, é por volta dos quarenta anos que a face e o corpo, esculpidos lentamente desde o nascimento por cinzéis invisíveis, revelam o que nem roupas nem maquiagem podem esconder.

O professor Aizu Yaichi* escreveu certa vez a um desconhecido: Meu caro amigo: em cada circunstância, agindo e pensando com tranqüilidade, atenção e o coração em paz, espero tornar-me uma pessoa bonita. São palavras comoventes. Também te desejo ardentemente envelhecer desse modo.



Livro: Para uma pessoa bonita – Contos de uma mestra Zen

Autora: Shundo Aoyama Rôshi – Prefácio da Monja Coen

*Aizu Yaichi (1881- 1956) – também conhecido como Shûsô Dojin, poeta de Tanka, historiador de arte e calígrafo. Tanka significa literalmente poesia curta. São poemas de 31 sílabas, contínuas de cinco linhas na seguinte formação: 5-7-5-7-7.